A usucapião é um instrumento jurídico consagrado no ordenamento brasileiro que permite a aquisição da propriedade pela posse prolongada, contínua e com animus domini (falei juridiquês, eu sei, desculpe). Contudo, sua aplicação em contextos de herança e condomínio hereditário demanda cautela e conhecimento técnico.
É comum, no Brasil, que após o falecimento dos genitores, um dos filhos permaneça residindo no imóvel de família. Isso, inicialmente tolerado pelos demais herdeiros, pode se transformar, com o tempo, em uma ocupação exclusiva com pretensão de domínio, abrindo margem para o pedido de usucapião.
Usucapião de imóvel herdado: é possível?
Sim. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (STJ) reconhece que um dos herdeiros pode, excepcionalmente, adquirir por usucapião o bem da herança, desde que comprove todos os requisitos legais, a saber:
- Posse contínua e ininterrupta pelo prazo legal (art. 1.238, CC – 15 anos; ou 10 anos, se houver moradia habitual e benfeitorias);
- Posse com exclusividade, sem a utilização conjunta com os demais coproprietários;
- Anima domini — ou seja, o ocupante deve agir de forma ostensiva como se fosse o proprietário único;
- Ciência e inércia dos demais herdeiros, por período superior ao exigido pela modalidade de usucapião pleiteada.
REsp 1.301.689/SP, julgado sob o rito dos recursos repetitivos (Tema 492), firmou o entendimento de que a usucapião contra herdeiros não é automaticamente vedada, mas depende da demonstração inequívoca de posse exclusiva e com exclusão dos demais coproprietários.
Como evitar o risco da usucapião?
A melhor estratégia é formalizar a oposição à posse exclusiva do herdeiro que ocupa o imóvel. Isso se faz, principalmente, por meio de notificação extrajudicial com Aviso de Recebimento (AR) ou por meio do registro da notificação em cartório de títulos e documentos.
Esse ato jurídico tem duas finalidades principais:
- Interromper a contagem do prazo da usucapião;
Demonstrar a ausência de “posse pacífica”, um dos requisitos essenciais para sua configuração.
Além disso, o envio da notificação formal representa ato inequívoco de oposição à posse exclusiva, desqualificando a caracterização de “animus domini” por parte do ocupante.
Quais medidas judiciais cabem?
Caso o diálogo não seja eficaz, o herdeiro ou os coproprietários interessados têm diversas medidas judiciais à disposição:
a) Ação de Arbitramento de Aluguéis
Busca definir judicialmente o valor de aluguel proporcional devido pelo herdeiro que utiliza exclusivamente o imóvel, sem autorização dos demais. O valor é geralmente baseado no mercado imobiliário local.
b) Ação de Reintegração de Posse ou Imissão na Posse
Quando ainda há inventário em aberto ou indivisão formal, pode-se pleitear o reequilíbrio do uso do bem, com acesso equitativo aos demais herdeiros.
c) Ação de Extinção de Condomínio com Venda Judicial do Bem
Caso não seja possível a divisão física do bem, qualquer coproprietário pode requerer a dissolução do condomínio, com a alienação judicial do imóvel e divisão do valor obtido, conforme o art. 1.322 do Código Civil.
Embora a usucapião entre herdeiros seja excepcional, o risco existe e pode levar à perda de direitos patrimoniais relevantes se medidas preventivas não forem adotadas.
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